Vitor Hugo
1 de set de 20233 min
Atualizado: 5 de set de 2023
As pessoas usam o termo HEMA, sigla em inglês para Historical European Martial Arts, como se fosse uma arte marcial específica. Mas na verdade, a expressão "Arte Marcial Histórica Europeia" carrega um significado profundo e abrangente. Cada palavra do termo - "arte", "marcial", "histórica" e "europeia" - contribui para uma rica tapeçaria de conhecimento e tradição. Nesta exploração, mergulharemos em cada componente do termo, desvendando suas nuances e relevância nas artes marciais contemporâneas.
A palavra "arte", do Latim "ars" (técnica, habilidade) transcende a simples mecânica do combate. Refere-se à expressão habilidosa das técnicas, do fazer, do conhecimento, em que a estética e a eficácia se entrelaçam. Além disso, "arte" denota a presença de uma filosofia subjacente, incluindo valores como disciplina, autoaperfeiçoamento e respeito.
Apesar do senso comum relacionar às artes marciais orientais, o termo retornou devagarinho as suas origens latinas. Marcial vem do Latim "martialis" (origem ou relação com Marte, deus romano da guerra). Assim, o termo pode ser empregado para representar qualquer forma de combate usado, ou que tenha origens, na guerra ou no conflito interpessoal, independentemente da cultura de origem. Pode ser desde a prática de tiro com arco ou armas de fogo, ao combate equestre, boxe e até a prática de esgrima.
A palavra "histórica" atua como uma ponte entre o passado e o presente. Ela enfatiza a natureza documentada e preservada das técnicas e métodos. Estudar as artes marciais históricas não é apenas aprender a lutar, mas também explorar e compreender a mentalidade e as circunstâncias das eras passadas.
A maioria das artes marciais históricas praticadas hoje em dia têm uma linhagem de professor-aluno que vai até a sua origem (Koryu, por exemplo); ou foram redescobertas e recriadas a partir de textos históricos (HEMA em grande parte); ou estão sendo redescobertas por meio da experimentação e estudo de artefatos, histórias e arte da cultura em questão. Pankration, uma arte marcial de combate desarmado, descrita como parte dos jogos Olímpicos, tem sido redescoberta por meio da cerâmica e afrescos. Artes marciais "vikings" estão sendo redescobertas por meio de experimentação, reprodução das armas e armaduras e descrições das sagas.
O adjetivo "europeia" indica a origem geográfica dessas tradições. Elas são intrinsecamente enraizadas no contexto cultural e histórico da Europa. A diversidade de nações e regiões europeias se reflete nas variações de estilos e abordagens, criando um panorama complexo e enriquecedor.
Em termos de cultura, a Europa é muito diversa, com diferentes grupos étnicos e com muitas influências da Ásia e da África. É possível recriar a arte de praticamente todas as partes da Europa, e existem grupos hoje em dia que tentam fazer isso. Porém, a Itália e a Alemanha certamente têm a maioria dos manuscritos da Idade Média e Renascença, o que as tornam muito populares entre os praticantes. Mas, como dito antes, existem muitas formas de explorar e se conectar com a arte histórica.
É importante frisar que língua ou região comuns não são o bastante para classificarmos duas coisas distintas como sendo da mesma arte: cada mestre ensinava a sua própria arte. Embora existam linhagens definidas em que um único mestre ensinou vários alunos, cada aluno inovou e expandiu a arte à sua maneira, o que torna difícil enquadrar vários autores como sendo parte de um mesmo "sistema". Enfim, isso já é outra discussão...
Juntas, essas palavras compõem uma definição rica e holística de "Arte Marcial Histórica Europeia". Refletem a síntese de técnicas, filosofias, história e geografia. Essas tradições não são simplesmente uma sequência de movimentos, mas uma herança viva que incorpora a busca por excelência, autoaperfeiçoamento e a compreensão da evolução das sociedades europeias.
Na nossa escola, ensinamos uma forma própria do Armizare (termo usado pelo cavaleiro italiano Fiore dei Liberi do século XV para se referir a seus ensinamentos), que está sob o guarda-chuva das Artes Marciais Italianas, que está contido no termo ainda mais amplo HEMA. Na publicação Introdução à Metodologia e Pedagogia da Praeliator: A Jornada Rumo à Maestria nas Armas Históricas, abordo o recorte histórico e geográfico que fazemos em nosso sistema de combate.
Se você está começando agora a praticar HEMA, ou está formando um grupo, dedique um tempo para pensar qual é a Sua Arte. Converse com seus colegas e estabeleça quais serão os "escopos" que desejam abordar. Se você já pratica HEMA, deixe nos comentários quais são os escopos que você escolheu para a sua prática, isto é...
Qual é a sua arte?